São Paulo 471 anos: Fazendas urbanas e agricultura familiar abastecem mercado de alto valor agregado
Produção agrícola da cidade, das zonas rurais ao centro, se destaca por inovação, sustentabilidade e tradição
Secretaria de Agricultura e Abastecimento de SPSão Paulo, a maior metrópole da América Latina, costuma ser lembrada pelos altos edifícios, grandes avenidas e uma paisagem cinzenta, resultado de um intenso processo de urbanização. O que muita gente não sabe é que quase um terço do território da cidade é rural, com fazendas, unidades de conservação, parques e aldeias indígenas, territórios que possuem vocação com preservação ambiental e produção de alimentos.
Neste aniversário de 471 anos da “Terra da Garoa”, dia 25 de janeiro, a Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo destaca a atuação de produtores rurais e empresas do agro da capital paulista, que se espalham do centro, com modernas fazendas e hortas urbanas, aos extremos da cidade, onde se encontram centenas de estabelecimentos agropecuários.
Os produtores de banana Yumi Murakami e Zundi Murakami produzem bananas orgânicas em Parelheiros, extremo sul da capital, em um negócio familiar que se iniciou em 1940. “Nossa produção é toda familiar, colhemos de sete a oito toneladas de banana por mês. Muita gente não acredita que somos produtores orgânicos na capital, mas somos pioneiros no ramo”, destaca Yumi.
Conheça a história destes produtores clicando aqui.
A Urban Farm, horta urbana orgânica no bairro do Ipiranga, é uma das iniciativas que promovem transformações no território e na vida da população local por meio da atividade agrícola. Produzem cerca de 2 toneladas de alimentos por mês, em um modelo sustentável de produção. “Focamos no cultivo de hortaliças, fechando todo ciclo do alimento. Em 2024, geramos 148 toneladas de resíduos compostados, que iriam pros aterros, mas é reutilizado no bairro”, conta César Bisconti, fundador.
Entre os clientes, estão os principais restaurantes da cidade, como o Arturito, da chef Paola Carosella e o Chu Restaurante, hotéis, como o Renaissance, além de bares, escolas e creches. Com a recuperação ambiental do local e atividades na horta, o negócio impacta positivamente o bairro. “A nossa horta trouxe vida ao bairro. Resgatamos hábitos que foram se perdendo durante o tempo, como crianças colhendo alimentos pela primeira vez, valorizando os alimentos. É um respiro dentro da cidade”, complementa César. A iniciativa também já ressocializou nove pessoas em situação de vulnerabilidade por meio da atividade de plantar e colher.
A cidade de São Paulo conta com 797 propriedades rurais, segundo levantamento da gestão municipal, sendo 70% de agricultura familiar, com propriedades de até 20 hectares. Muitos estabelecimentos rurais de SP são liderados por mulheres, chegando a 29% com protagonismo feminino, como a fazenda de Lia Góes, proprietária da Fazendinha Pedaço do Céu, em Parelheiros, zona sul de SP.
“Produzimos cerca de 30 produtos, como milho, feijão, abóbora, mandioca, taiobas, bananas e batata doce. 70% da nossa propriedade é preservada, aumentamos as frutas nativas da região, como as árvores cambuci, uvaia, araucária e juçara”, conta Lia. O estabelecimento produz sua própria compostagem, capta água da chuva, e trabalha com a técnica de curva de nível para aumentar a produtividade do solo. Os ovos produzidos vem de galinhas criadas fora do sistema de gaiolas, ficando livres na propriedade.
A agricultura no território paulistano contribui com a preservação de uma grande área de florestas nativas e mananciais de água, gerando também alimentos de boa qualidade nutricional, com uma variedade de preços e uma diversidade capaz de atender a diferentes públicos-alvo.
“Nós mantemos sistema agroflorestal com produção de café, frutas, criação de peixe, galinhas e abelhas sem ferrão. Transformamos uma área degradada em um oásis em meio a prédios e ruas asfaltadas”, conta Jozemar Gonçalves de Lima, do Meliponário Bonifácio.
O produtor começou a criar abelhas nativas há 8 anos em Itaquera, zona leste. Com a regularização do meliponário, complementa sua renda com venda de colmeias, mel e extrato de própolis, além de mudas e frutas. Jozemar conta que o local, um terreno público, já serviu como depósito de lixo.“Hoje, se tornou uma grande área verde, com árvores nativas como o pau-brasil, ipês, araucárias, ingás e jerivás. Assim como a produção de Jozemar, existem mais de 1.600 hortas em equipamentos públicos, que são tocadas pelas populações locais.
Fonte de renda para centenas de famílias que vivem da agricultura há gerações, muitos desses espaços promovem uma relação mais próxima com a comida, permitindo que os consumidores saibam como e onde são plantados os alimentos que chegam à sua mesa.
Na cidade de São Paulo, também há a presença de descendentes de quilombolas, que vivem em espaços de solidariedade, promovendo o respeito ao meio ambiente, sociabilidade e, é claro, a produção de alimentos. O Quilombo Martins, na zona leste, trabalha com a horticultura de forma familiar, gerando também produtos de valor agregado, como chocolates, pães, biomassa de banana e bolos, que levam o nome de “delícias negras”.
As propriedades agrícolas são maioria na zona sul do município, com 611 estabelecimentos, seguida por 131 na zona leste, principalmente nas áreas rurais. Porém, também há a presença da agricultura na cidade, com 190 hortas urbanas que vão desde espaços cooperativos de bairro a empresas com importante produção e tecnologia agrícola.
Fazendas urbanas: tendência encontra mercados no centro da capital paulista
Em um ambiente de produção controlado e otimizado, as fazendas verticais cultivam alimentos indoor, substituindo a luz solar por iluminação de LEDs, controlando os níveis de temperatura, umidade e CO² em salas de cultivo e fornecendo nutrientes por meio de soluções com sais minerais. O modelo utiliza hidroponia, técnica de cultivo sem a necessidade de terra, mas aplica tecnologias para obter alta produtividade nas cultivares empilhadas em prateleiras - daí, o nome fazenda vertical.
A Pink Farm, maior fazenda vertical urbana da América Latina, está instalada na Vila Leopoldina, zona oeste da capital, e se destaca por usar menos recursos do que uma produção convencional. “Utilizamos muito menos água e sais minerais, e produzimos sem o uso de defensivos. Por outro lado, o uso de energia elétrica é bem mais intensivo”, destaca Rafael Delalibera, co-fundador da Pink Farm, nome que faz referência às suas luzes azuis e vermelhas presentes na produção, criando um ambiente iluminado que chama a atenção.
A empresa produz cinco tipos diferentes de alface e nove tipos de microverdes, os brotinhos que chefs utilizam para decorar pratos, e chama atenção do mercado consumidor paulistano pelo frescor dos alimentos e da produção orgânica. “Por estarmos na capital, reduzimos os gastos logísticos e conseguimos entregar um produto mais fresco para o cliente. A proximidade reduz, também, as perdas pós colheita, que acabam afetando bastante a produção convencional”, complementa Rafael.
A Fazenda Cubo, sediada em Pinheiros, zona oeste, produz mais de 40 variedades de hortaliças entre folhas para salada, brotos, ervas aromáticas e flores comestíveis e atende restaurantes renomados, mercados e pessoas físicas. Restaurantes como o Maní, da chef Helena Rizzo, o Corrutela, com estrela do prêmio Michelin, o Fitó, de cozinha brasileiro com características nordestinas, e o Preto Cozinha, que mistura elementos de Brasil, África e Portugal.
Para Paulo Bressiani, fundador da empresa, há uma série de benefícios ambientais e comerciais no modelo de produção, como o desperdício zero e a proximidade com os clientes, o que minimiza o deslocamento e o uso de combustíveis. “Na parte ambiental, o consumo de água é muito reduzido, pois utilizamos irrigação com recirculação de água. Em relação à produção, conseguimos manter a mesma qualidade o ano inteiro, com as condições controladas”, destaca.
A empresa destaca a importância de aproximar o plantar e o comer, transformando a nossa relação com os alimentos e a natureza em uma metrópole como SP. “Com a industrialização da produção de alimentos, nos afastamos demais da origem deles. É fundamental nos reaproximarmos da origem daquilo que comemos para termos acesso a alimentos saudáveis e que criem um impacto positivo no nosso entorno, regenerando paisagens”, finaliza Bressiani.