03/04/18 11h41

Rota 2030 deve ganhar solução salomônica

Valor Econômico

No meio da disputa inconciliável entre integrantes do governo sobre o futuro da política automotiva, surgiu uma proposta salomônica para desfazer o impasse em torno do Rota 2030, que está sendo aguardado com ansiedade pelas montadoras desde o fim do ano passado.

A nova versão do programa prevê que os créditos tributários concedidos às empresas do setor por investimentos em pesquisa e desenvolvimento tecnológico poderão ser usados no abatimento de qualquer imposto federal, incluindo IPI e PIS/Cofins, por um prazo de três anos. Do quarto ano em diante, a dedução seria feita exclusivamente do montante devido em Imposto de Renda e CSLL.

Esse formato do Rota 2030 fica bem no meio do caminho entre o que vinham defendendo o Ministério da Fazenda - com forte apoio da Casa Civil - e o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (Mdic). Não havia mais discordância sobre a necessidade de um novo regime de longo prazo para substituir o Inovar-Auto, condenado pela Organização Mundial do Comércio (OMC), que expirou em 31 de dezembro. Também não havia mais divergência sobre dar incentivos às montadoras que conseguirem ultrapassar metas de eficiência energética para os seus carros.

O grande conflito nos últimos meses gira em torno dos créditos de até R$ 1,5 bilhão por ano para os investimentos em pesquisa e desenvolvimento. A equipe econômica aceita o uso dos créditos somente por meio da Lei do Bem (11.196/05), que restringe o abatimento ao IR e à CSLL. Problema: as montadoras, com discurso encampado pelo Mdic, avisam que isso teria efeito inócuo. Elas alegam que, devido à brutal queda nas vendas por causa da recessão dos anos recentes, vêm operando com prejuízo e não têm pago esses dois impostos. Querem, então, permissão para deduções também no IPI e no PIS/Cofins - além do Imposto de Importação.

Há menos de duas semanas, após uma visita à fábrica da Fiat em Goiana (PE), o presidente Michel Temer tentou colocar um ponto final no impasse entre as áreas do governo. No voo de volta a Brasília, chamou para uma conversa os ministros Henrique Meirelles (Fazenda) e Marcos Jorge (Indústria). Depois de ouvir argumentos dos dois lados, orientou seus subordinados a adotar um período de três anos de transição.

A orientação continua enfrentando resistência das equipes técnicas, a ponto, por exemplo, de a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) não ter enviado ainda sua análise final do texto. Observadores na Esplanada dos Ministérios acreditam que isso reflete o enfraquecimento de Temer.

De qualquer forma, já estão sendo providenciados convites aos executivos de todas as montadoras instaladas no país para apresentar o novo desenho do Rota 2030, em uma reunião no Palácio do Planalto, dia 12 (quinta-feira da semana que vem).

Enquanto uma decisão definitiva não é tomada, nota-se o aumento expressivo das importações de veículos. Dados divulgados ontem pela Secretaria de Comércio Exterior (Secex) indicam aumento de 76% nos valores de automóveis trazidos do exterior no primeiro trimestre. De janeiro a março de 2017, quando o Inovar-Auto ainda estava em vigência e havia uma alíquota adicional de 30 pontos percentuais de IPI sobre os carros importados, entraram no Brasil 34.345 unidades - valendo US$ 540 milhões.

Nos três primeiros meses deste ano, sem um novo regime automotivo, esse número aumentou para 50.876 unidades e um valor total de US$ 922 milhões. O secretário Abrão Árabe Neto fez questão de ponderar: cerca de 60% do crescimento das importações provém de Argentina e México, dois países com quem o Brasil tem acordos automotivos, e portanto não eram alvos do "super IPI" que era base do Inovar-Auto.

Na descrição de Abrão, os outros 40% de aumento têm origem em fornecedores como Alemanha, Estados Unidos, Coreia e Japão. As montadoras desses países, sim, ficaram livres de exigências com o fim do regime anterior e o impasse no Rota 2030. No fim das contas, é difícil dizer o que é fruto da recuperação econômica e o que reflete a ausência de política setorial.