Réplicas digitais de fábricas ajudam a tornar indústria mais competitiva
Empresa criada por professor e ex-aluno da USP cria “gêmeos digitais”, ambientes simulados que permitem testes com baixo custo
Jornal da USPO objetivo do engenheiro Rodrigo Juliani, que fez sua formação na Escola Politécnica (Poli) da USP, em São Paulo, da graduação ao pós-doutorado, sempre foi aproximar a academia do setor produtivo. A ideia era de que seus estudos pudessem ser úteis no desenvolvimento da indústria brasileira. Com isso em mente, ele e seu ex-orientador, o professor Claudio Garcia, começaram uma startup voltada à criação de modelos de processos industriais construídos em ambiente digital. Os modelos reproduzem o funcionamento de uma fábrica e permitem às empresas testar e implementar melhorias para ampliar sua eficiência.
A empresa Cursor Identificação e Controle busca aliar as necessidades da indústria do País ao conhecimento consolidado nos quase dez anos do grupo de pesquisa liderado por Garcia, que é professor do Departamento de Engenharia de Telecomunicações e Controle da Poli.
Segundo Rodrigo Juliani, os modelos podem ser usados para aplicar técnicas de projeto de controles e processos consolidadas na teoria, colocando-as em prática. “Essas técnicas ainda não estão na indústria, apesar de serem ensinadas há décadas na Universidade.”
O grupo de pesquisa de Juliani e Garcia leva o nome da atividade sobre a qual eles se debruçam, a identificação de sistemas, que consiste em coletar dados de um processo para modelar matematicamente esta estrutura e criar uma réplica digital.
Desde 2010, eles estudam esses modelos matemáticos digitais, que podem ser utilizados para projetar e implementar técnicas de controle avançadas, prever e prevenir falhas e acidentes, otimizar e acompanhar o desempenho dos processos, realizar treinamentos de operadores e antecipar o comportamento dos processos sob diversos cenários de operação.
Com a modelagem, é possível, por exemplo, estimar quanto gás será necessário para aumentar a temperatura de uma caldeira e otimizar o sistema de controle para reduzir o consumo de gás e tornar a caldeira mais eficiente.
Esse tipo de modelo é chamado “gêmeo digital”, uma cópia da planta, ou seja, do processo industrial, que torna possível realizar simulações e testes com baixo custo, tornando a indústria mais eficiente.
Para melhorar o controle de um processo, havendo um simulador completo da indústria, o teste pode ser realizado no simulador, e não na planta real. Além disso, caso a planta esteja apresentando um comportamento diferente do esperado, o sistema pode alertar aos operadores de que há algum problema na fábrica antes que ocorra uma falha ou um acidente”, explica o professor Cláudio Garcia, coordenador do grupo.
A Cursor Identificação e Controle segue um modelo muito difundido no mercado americano, de gerar ideias na universidade para criar produtos. “Nos Estados Unidos, o Vale do Silício é um centro de inovação, repleto de startups. O americano é habituado a ter na universidade grupos de pesquisa desenvolvendo produtos que vão para a sociedade”, explica Claudio Garcia.
A iniciativa recebeu o prêmio de inovação Startups Connected da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Alemanha de São Paulo (AHK São Paulo) na categoria Papel e Celulose, e foi finalista no projeto Corporate Venture in Brasil – Oil & Gas da Apex Brasil e no desafio Gyntec Soluções Inteligentes para a Indústria Farmacêutica.
Renovação na carreira de engenheiro
Juliani relata que, estudando na Poli, parecia haver duas opções: seguir a carreira acadêmica e se tornar um professor da Universidade, ou sair da graduação e atuar como engenheiro em uma empresa. A opção de fazer pesquisa e transformá-la em um produto, por ser algo novo no Brasil, veio com muita dificuldade.
Ele explica que uma startup permite unir atividades de pesquisa e desenvolvimento, atuação no mercado de engenharia e empreendedorismo. Entre os fatores que contribuíram para a consolidação da empresa está o programa de formação de empreendedores oferecido pela Poli. Segundo Juliani, a startup é uma continuação da pesquisa. “A universidade vai gerar a teoria, gerar ciência, e a startup vai transformar essa ciência em tecnologia para entregar para a sociedade.”
A decisão de criar uma empresa ocorreu em 2014 e o apoio do Programa Fapesp Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe), a partir de 2016, permitiu que Juliani e Garcia transformassem o grupo de pesquisas em startups, e passassem a pesquisar não apenas ciência básica, mas também a desenvolver tecnologia.
No mesmo ano, eles começaram a estruturar a própria startup. Ano passado, eles começaram as primeiras divulgações e ganharam os primeiros prêmios. Neste ano, a primeira versão do produto ficou pronta e a startup está começando a oferecer serviços para melhorar os processos das indústrias nacionais.
“A ideia não é ser uma empresa que só faz consultoria com base em um produto que já está pronto, mas sim continuar sempre com a inovação e a pesquisa, além da aplicação do produto criado.” Juliani detalha que o grande diferencial da startup em relação à academia e à indústria é desenvolver um produto novo e aplicá-lo no mercado.