04/10/12 15h22

Região de Sorocaba deve ser polo nuclear de alta tecnologia

Cruzeiro do Sul

Marinha projeta desenvolvimento do Centro Experimental Aramar, em Iperó

A região de Sorocaba será um polo nuclear de alta tecnologia num prazo de aproximadamente 10 anos. E o coração desse polo é o Centro Experimental Aramar, unidade de pesquisas do programa nuclear da Marinha localizada em Iperó (a 15 quilômetros de Sorocaba), com todo o valor agregado do empreendimento e o cronograma dos novos investimentos envolvendo os militares, a Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen) e a Universidade de São Paulo (USP). Na ponta dos investimentos está a construção do primeiro submarino nuclear brasileiro, que tem previsão (segundo a Marinha) para entrar em operação em 2025.

Esta projeção é admitida pelo superintendente do programa nuclear da Marinha, Luciano Pagano Júnior. Ele apresentou anteontem em Sorocaba uma palestra sobre o submarino nuclear brasileiro. O encontro, que atraiu 112 pessoas, aconteceu no auditório do Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Sorocaba (IHGGS). O evento foi uma realização da Sociedade Amigos da Marinha (Soamar) de Sorocaba com apoio do IHGGS e da Esamc.
 
Dois reatores nucleares
 
Chegará o momento em que a Fazenda Ipanema, onde está localizado Aramar, terá dois reatores nucleares: o que pertence ao programa nuclear da Marinha e o da Cnen. Com potência de 48 megawatts térmicos, o reator de Aramar será pressurizado, terá temperatura em torno de 300 graus celsius e gerará energia elétrica. Ele ficaria pronto em 2015 e teve cronograma adiado para 2015, por questões de "complexidade", segundo Luciano. O reator da Cnen será do tipo tipo "piscina", isto é, será instalado num grande tanque com água e terá temperatura em torno de 40 graus celsius. Sem pressão, não gerará energia elétrica. Sua potência será de 20 megawatts térmicos.

A Marinha cedeu 1,2 milhão de metros quadrados de toda a sua área para a Cnen instalar o seu reator de "multipropósito", e que tem três objetivos: produção de radiofármacos, remédios nucleares utilizados no tratamento de câncer e no diagnóstico de tumores; ensino e pesquisa, uma das responsabilidades da Cnen; testes de materiais, que consiste no desenvolvimento de novas ligas metálicas e novos combustíveis O projeto do novo reator foi iniciado há um ano com prazo de 8 anos para ser instalado - faltam 7 anos. Os investimentos continuam sendo executados.

Além disso, a USP desenvolve projeto de instalação de um câmpus vizinho a Aramar, em terras da Fazenda Ipanema. Luciano também adiantou que, quando o submarino nuclear estiver pronto, Aramar vai ser o local de treinamento da tripulação do gigante dos mares que será utilizado na defesa da costa brasileira de mais de 8 mil quilômetros de extensão.

"A Fazenda Ipanema será um grande complexo, um grande polo de tecnologia nuclear no Brasil", descreveu Luciano. Na sua análise, "isto significa empregos, investimento", Explicou que o reator de "multipropósito" terá receita fixa, como resultado da produção de radiofármacos: "Significa qualificação de mão de obra, não só na área nuclear. Projetos nucleares em geral trazem toda uma qualificação consigo, em termos de soldadores, técnicos, inspetores, uma formação de mão de obra qualificada que a região absorve muito bem."

O contra-almirante avaliou que Sorocaba tem grande tradição de formação de profissionais qualificados por meio de suas escolas técnicas, Faculdade de Tecnologia (Fatec) e universidades instaladas na região.

Ultracentrífugas para a INB
 
Luciano revelou que, por meio da construção de ultracentrífugas, Aramar participa dos planos da estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB) de buscar a autossuficiência nacional na área de combustível nuclear para as usinas brasileiras. Além de ter produzido ultracentrífugas para uso próprio, Aramar fabrica estas máquinas também para a INB. De um total de 10 conjuntos de máquinas, Aramar já produziu quatro (em 2006, em 2009, em 2010 e 2012). As próximas etapas serão atendidas de acordo com o ritmo de execução do cronograma de investimentos da INB.
Cada conjunto de ultracentrífugas recebe o nome técnico de "cascata".

Elas são utilizadas no processo de enriquecimento de urânio. Este é um domínio tecnológico importante para a produção do combustível nuclear. Países que têm esse conhecimento não o transferem a outras nações. O Brasil, por meio da Marinha, teve que desenvolver soluções próprias para fabricar as ultracentrífiguas em condições de excelência que permitam o enriquecimento do urânio destinado às usinas nucleares. O combustível produzido pela INB é encaminhado para atender parte das necessidades dos reatores das usinas de Angra 1 e 2.

"Ainda não torna o Brasil autossuficiente na área de enriquecimento isotópico, isso aí é um segundo passo que seria a expansão desse programa", afirmou Luciano. "O que a conclusão desse contrato vai ocorrer é isso, o que vai acontecer daqui a alguns anos: atender Angra 1 integralmente e 20% de Angra 2."

As quatro "cascatas" de ultracentrífugas produzidas em Aramar estão em funcionamento na INB. A quarta "cascata" está em período de "comissionamento", o que consiste em treinamento de operadores, identificar eventuais defeitos e melhorar itens de operação.
As "cascatas" que estão em operação em Aramar são destinadas exclusivamente à Marinha e ao reator do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen) de São Paulo.

Acidente em Fukushima é tema de debate

O contra-almirante Luciano Pagano Júnior também falou sobre os impactos provocados no mundo pelo acidente nuclear de Fukushima, no Japão, causado por terremoto seguido de tsunami em 2011, e que consistiu em decisão da Alemanha de desligamento de usinas nucleares. Luciano disse que a decisão do governo alemão tem explicações específicas. Primeiramente, o Partido Verde é muito forte e tem grande tradição na Alemanha.

E mais: "A Alemanha importa energia nuclear da França, cujos reatores estão ali próximos da fronteira. É uma decisão política, mas que é interessante porque, se houver algum problema de segurança em reatores nucleares, o reator francês está exatamente do lado da fronteira alemã. Essa é uma decisão soberana do governo alemão."

Perguntado sobre o que acha de eventuais críticas que, comparando o programa nuclear brasileiro com a decisão da Alemanha, podem acusar o Brasil de estar na contramão, Luciano disse: "Na verdade não existe uma mão nem uma contramão. Existem alguns países que (tomaram a decisão), por exemplo, no caso da Itália, no caso da própria Alemanha, de não construir mais usinas ou de desligar as suas usinas. Por outro lado temos outros países como a França, Finlândia, Coreia, Índia, China, que investem fortemente, a despeito de Fukushima, em energia nuclear.

Existem tendências. Cada país sabe onde o calo aperta: o que é melhor para aquele país? o que é mais barato? o que é mais seguro?". Segundo ele, os Estados Unidos voltaram a construir usinas nucleares e não existe uma tendência mundial que siga o exemplo da Alemanha: "A maior parte dos países continua investindo no nuclear, e não desistindo. A Alemanha é um fato um pouco diferente, a Itália também, dos demais países."