05/12/23 15h31

Produtores da região Noroeste paulista buscam manter a tradição de sementes crioulas

Produtores da região Noroeste paulista que mantêm no campo as sementes crioulas ou nativas buscam preservar a tradição das sementes sem melhoramento genético

Diário da Região

Importantes para manter a biodiversidade, garantir a alimentação e contribuir para a semeadura de diversas culturas agrícolas, as sementes têm variedades modificadas geneticamente ou não. Com as sementes tradicionais, também conhecidas como nativas ou crioulas, produtores ou comunidades - denominados como guardiões das sementes -, aplicam a tradição desses plantios, sem modificar as variedades, mantendo características que valorizam os costumes, adaptação regional, sabor e qualidade, além de baixo custo de produção.

No Noroeste paulista, especialistas explicam que produtores e comunidades de povos originários ainda estão empenhados em manter a tradição das sementes, conhecidas como crioulas ou nativas. “Essas sementes são verdadeiras joias, são patrimônio cultural inclusive, embora não se tenha mais muitas delas em abundância no Brasil”, conta o agrônomo Leandro Biral, da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati).

Biral diz ainda que vem incentivando, junto com outras instituições, as feiras para as trocas de sementes, em São Paulo, estado que concentra ainda regiões em que os produtores e comunidades fazem o plantio com a utilização das sementes tradicionais. “Em Andradina, por exemplo, no Noroeste paulista, há até uma legislação municipal para manter o manejo das sementes nativas”, ressalta.

Segundo Débora Pavani Silva, aluna de pós-gradução do curso de engenharia agronômica da Unesp, de Ilha Solteira, foi realizado um trabalho na região de Andradina (total de 11 municípios) junto às comunidades de assentamentos e de produtores rurais para levantar o uso de sementes crioulas no campo.

“O termo semente crioula, às vezes nem é reconhecido pelos agricultores, eles falam semente de paiol, como para uma semente tradicional de milho. Mas o importante é que conseguimos identificar que muitos deles ainda mantêm o uso dessas sementes para diferentes culturas”, afirma Débora. Ela disse ainda que nesta região, as sementes crioulas mais encontradas foram as de feijão-catador (conhecido comercialmente como feijão-fradinho), além de sementes de milho da palha-roxa.

Agricultura familiar

Débora diz ainda que as sementes crioulas têm manejo nas propriedades de agricultores familiares como forma de eles ampliarem a autonomia produtiva e a segurança alimentar, além de manter a tradição na terra. “Apesar de não termos muita disponibilidade dessas sementes, ainda encontramos os agricultores que fazem esse cultivo e que utilizam, por exemplo, a palha do milho de cor roxa para que as mulheres façam o artesanato. Um desses produtores mantém a tradição de três gerações no cultivo desse milho de semente crioula”.

No estudo de Débora foi possível concluir que o uso das sementes tradicionais é importante para os agricultores familiares, sendo essencial apoiar e incentivar o manejo dessas semeaduras. “Acho que perdendo as sementes crioulas, corremos o risco de perda da biodiversidade”, finaliza.

Políticas públicas para o setor

De acordo com pesquisadores em sementes tradicionais, é importante que além da sustentabilidade, ocorra a governança, para que cada região do País possa adaptar essas semeaduras conforme o microclima do local. E em termos de políticas públicas, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) tem comprado sementes nativas fornecidas por agricultores familiares para atender a demanda do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).

A pesquisadora científica do Instituto Agronômico (IAC), Cristina Fachini, pontua sobre a importância dessas políticas públicas para que as sementes tradicionais sejam valorizadas. “As sementes crioulas são a manutenção da biodiversidade e, além disso, são reconhecidas pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO)”.

Como exemplo, Cristina diz que o milho, atualmente posicionado no mercado como uma commodity, tem significados ancestrais para muitas comunidades indígenas que fazem rituais e ainda mantêm algumas festas em municípios brasileiros para celebrar a colheita do cereal.

“Temos hoje o milho híbrido, mais conhecido, que é o comercial e possui cor amarela, aquele de melhoramento genético. Mas as comunidades ou produtores que cultivam o milho a partir de sementes tradicionais sabem que o grão possui uma infinidade de cultivares de cores que vão do vermelho, preto e roxo, de sabores diferentes, com alto teor de nutrientes”, diz a pesquisadora.

Ainda existem muitos desafios neste setor, segundo Cristina. Ela explica que as sementes crioulas podem ainda impulsionar o mercado de agricultura orgânica e da agroecologia, trazendo alternativas de renda para o produtor. “E esse mercado não é só de sementes, temos ainda tomates de várias cores, cenoura e outros tubérculos que, às vezes, não chegam aos supermercados, mas são tradicionalmente cultivados por esses agricultores”. (CC)

 

Fonte: https://www.diariodaregiao.com.br/economia/agronegocio/produtores-da-regi-o-noroeste-paulista-buscam-manter-a-tradic-o-de-sementes-crioulas-1.1920352