Plano diretor de ferrovias reduz nó na Baixada Santista
Valor EconômicoNuma tentativa de tornar mais eficiente o historicamente conturbado convívio no acesso à Baixada Santista, as transportadoras ferroviárias Rumo, MRS e VLI criaram um "plano diretor". A iniciativa consiste na adoção permanente de práticas integradas entre as três para ordenar o compartilhamento da colcha de retalhos ferroviária que leva ao porto de Santos - onde as cargas movimentadas pelo modal vêm crescendo em volume absoluto e em participação.
Ao eliminar gargalos comuns entre as próprias empresas em vez de levar os conflitos para serem arbitrados em instâncias distantes do problema, como a agência reguladora (ANTT), as companhias perceberam que têm a ganhar - e mais rapidamente.
Só a Rumo verificou aumento de 12% na média semanal de trens diários circulando em seu trecho no primeiro quadrimestre deste ano na base anual. E queda de 13% no desvio padrão da quantidade de trens diários circulando, indicador que retrata uma operação mais linear, com menos "picos e vales".
O plano, concebido em 2015, está assentado no tripé capacidade, processo e normatização. Juntas, Rumo VLI e MRS primeiro cotejaram a capacidade do sistema e a projeção de demanda para definir o plano de investimento que cada uma tem de fazer para atender um volume crescente de cargas.
No quesito "processos" a decisão foi melhorar práticas já existentes. E foram unificados regulamentos, manuais e procedimentos operacionais, do que derivou uma cartilha comum. Entre as medidas, há iniciativas aparentemente prosaicas, mas que foram um ponto de inflexão, como a coordenação de comunicação constante.
O processo envolve encontros diários das equipes de operação para organizar a chegada dos trens e reuniões frequentes das diretorias das companhias.
Antes, era comum os picos de carregamentos das empresas coincidirem no mesmo dia e travarem o sistema - o trem não passava. Agora, há distribuição cadenciada dos carregamentos. O resultado é que todo mundo carrega mais e circula mais próximo do teto do que quando cada um fazia seu planejamento isoladamente.
"É ganho de produtividade na veia. Não é um plano com data para acabar, é uma nova perspectiva de encarar a ferrovia na Baixada Santista, uma ferramenta de planejamento de longo prazo com gestão única do sistema", diz Rafael Langoni, gerente de projetos e relações corporativas da Rumo.
A empresa acessa a Baixada Santista pela Malha Paulista no trecho que vai de Boa Vista (Campinas) a Perequê (Cubatão). A partir daí, os trens entram via direito de passagem na rede concedida à MRS, que segue em direção às duas margens do porto santista - a direita (lado Santos) e a esquerda (lado Guarujá). São vários terminais nas duas margens, o que significa um número relevante de trens e vagões. O porto santista foi responsável por 28,7% da corrente comercial brasileira no acumulado do ano até o mês de novembro.
A malha da MRS corta São Paulo e parte do ABC paulista, em compartilhamento com a linha para transporte metropolitano da estatal paulista CPTM. Na descida da Serra, usa um sistema de cremalheira, depois do que a linha bifurca em "Y" em direção aos dois lados do cais.
A Rumo aumentou em 12% a média semanal de trens diários circulando em seu trecho; desvio padrão caiu 13%
Dentro do porto organizado propriamente, os trilhos são arrendados à Portofer, empresa da Rumo. A MRS também está na margem esquerda, mas fora da área do porto organizado. Em 2015 a movimentação da Portofer somou 30 milhões de toneladas e a estimativa é que chegue em 52 milhões de toneladas em 2025.
Já a VLI não tem malha própria na Baixada Santista. A FCA, sua controlada, chega até Campinas, onde entra no corredor da Rumo. A VLI precisa acessar o porto porque tem contrato de transporte com clientes.
Além disso, a VLI tem um terminal de uso privado para granéis sólidos, o Tiplam, localizado fora do porto de Santos, na área continental da cidade. O volume do Tiplam é, portanto, "extra-Portofer". Para as cargas chegarem a ele a VLI utiliza a infraestrutura da Rumo e depois a da MRS, via direito de passagem.
A VLI está concluindo uma grande expansão no Tiplam - prevista para ser inaugurada em 2017 - que vai acrescentar um potencial adicional expressivo de 12 milhões de toneladas por ano ante as 2,5 milhões toneladas atuais que faz. Cem por cento do volume destinado à exportação chegará ao terminal por ferrovia. Atualmente está em construção uma pera ferroviária dentro do terminal.
"O plano tem um funcionamento que começa desde a zona da produção. Se não operarmos bem, todo mundo acaba perdendo", diz o diretor comercial da VLI, Fabiano Lorenzi.
Segundo ele, os investimentos da VLI para melhorar a operação na Baixada com o novo conjunto de cargas que o Tiplam atrairá são feitos de forma combinada com as ferrovias. "É conversado ponto a ponto com as concessionárias."
Nas palavras de Gustavo Bambini, diretor de relações institucionais da MRS, "a Baixada Santista deixou de ser um problema e passou a ser uma busca de entendimentos". A linha da MRS na região viu um crescimento médio anual de 6,2% desde 2010, considerando o volume de toda a Baixada Santista. Exclusivamente o volume destinado ou originado no porto de Santos avançou 8,5% ao ano.
Grande parte dos investimentos já vem sendo feita nos últimos anos pelas empresas. Com o "plano diretor", elas podem racionalizar a aplicação dos recursos daqui para frente.
Desde 2013, a MRS investiu R$ 445 milhões na região, entre segregação, novas locomotivas especiais para a cremalheira, duplicação e sinalização, ampliação de pátios e melhoria da ponte do Casqueiro, em Cubatão, entre outros.
Já o investimento total da Rumo no corredor que deságua no porto foi de R$ 856 milhões, dos quais R$ 695 milhões somente na duplicação da descida Campinas-Santos, desde 2010. Precisamente na Portofer, a Rumo investiu R$ 110 milhões desde então - sendo parte da ALL, a antiga administradora, e a maior fatia da Rumo, empresa originada da fusão entre Rumo e ALL em 2015.