25/04/18 13h49

Montadoras vão ter Lei do Bem "turbinada"

Valor Econômico

Depois de seguidos adiamentos, o governo está finalmente prestes a definir sua nova política automotiva. A última versão do Rota 2030 tem como base uma espécie de Lei do Bem "turbinada". Também prevê metas de eficiência energética e redução, de 25% para 7%, da alíquota de IPI para carros híbridos ou elétricos.

O presidente Michel Temer manifestou, em reuniões com assessores na segunda-feira e com representantes do setor ontem, que gostaria de fazer o anúncio do Rota 2030 antes de sua viagem para o Sudeste Asiático. A visita começa no dia 7 de maio. Técnicos dos ministérios envolvidos foram orientados a colocar o texto definitivo do programa no Sidof, o sistema eletrônico de tramitação de documentos, até o fim desta semana para um pente-fino da área jurídica.

A queda de braço vivida nos últimos meses em torno do novo regime automotivo deu lugar a uma solução de consenso na Esplanada dos Ministérios. Em linha com o que defendiam a equipe econômica e a Casa Civil, investimentos das montadoras em pesquisa e desenvolvimento (P&D) só poderão ser deduzidos do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre Lucro Líquido, como já tem ocorrido com a Lei do Bem (11.196 de 2005).

O Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (Mdic) queria abatimento em todos os impostos e tributos federais. Partia da premissa de que seria inócuo o uso dos créditos tributários no IR e CSLL. Isso porque as montadoras, devido à crise dos últimos anos, alegam prejuízo e não estão pagando esses impostos.

Chegou-se a um meio termo: o benefício às montadoras ficará restrito ao IR e à CSLL. Mas com uma diferença crucial: os créditos poderão ser guardados e usados em um período de pelo menos cinco anos. Ainda existe a possibilidade de estender esse prazo para toda a vigência do Rota 2030 - 15 anos. Esse ponto ainda está pendente e deve ser tratado hoje, junto com outros detalhes, em reunião da Receita Federal com técnicos do Mdic.

"Falta apenas concluir os textos", disse ao Valor o ministro da Indústria, Marcos Jorge de Lima, que minimizou as divergências na elaboração da nova política automotiva. "Trabalhamos esse tempo todo para ter um aperfeiçoamento do programa. O país saiu ganhando", resumiu o ministro.

Segundo ele, houve uma determinação do Palácio do Planalto de fazer "o quanto antes" a amarração final dos pontos ainda em aberto. "A vontade do presidente, se possível, é anunciar o programa antes da viagem para a Ásia", afirmou Marcos Jorge. Procurado, o Ministério da Fazenda preferiu não fazer comentários.

Ficou acertada a adoção de um multiplicador de 160% para o abatimento dos recursos investidos em P&D. Isso significa que, se a montadora aplicar R$ 10 milhões em novas tecnologias, ela poderia descontar R$ 26 milhões do lucro contábil. Com isso, paga menos IR e CSLL. A Lei do Bem prevê um multiplicador de 60%.

O uso dos créditos poderia chegar ao limite anual de R$ 1,5 bilhão. Há, no entanto, um problema de prazo e um problema fiscal. Em 2018, já não haveria tempo hábil para fazer tantos investimentos no que resta do ano. Em 2019, não haveria espaço no Orçamento. Por isso, os técnicos se comprometeram com uma "escadinha" até alcançar o valor de R$ 1,5 bilhão.

Marcos Jorge destacou outros "pontos de convergência" nas discussões. É o caso da tributação menor para carros híbridos ou elétricos, que depende apenas de decreto, sem a necessidade de mudança na lei. Estímulos à eficiência energética e à segurança veicular também tiveram o martelo batido. As montadoras poderão ganhar desconto de um ponto percentual no recolhimento de IPI, a partir de 2022, se tiverem melhorado em 12% o gasto de combustível por quilômetro rodado no primeiro ciclo de quatro anos do Rota 2030.

O presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Antonio Megale, queria que as deduções de investimentos em P&D das empresas pudessem ser feitas também no PIS/Cofins, IPI e Imposto de Importação. "A aplicação de mecanismos como a Lei do Bem tem de ser avaliada, porque esse mecanismo pressupõe que as empresas estejam fazendo lucro e pagando IR. Como boa parte das empresas está com prejuízo acumulado nesses últimos anos, a aplicação do mecanismo fica prejudicada", disse o executivo, à saída de reunião com Temer no Planalto.

A sinalização de um desfecho, contudo, traz alívio para as montadoras. Elas esperam pelo Rota 2030 desde o fim do ano passado. O programa substituirá o Inovar-Auto, que terminou em dezembro e foi condenado na Organização Mundial do Comércio (OMC). "Estamos avançando [na discussão] sobre eficiência energética, equipamentos de segurança e etiquetagem. O ponto central da discussão era o investimento em P&D, que é fundamental para reter no Brasil o conhecimento nessa área e, principalmente, na parte de tecnologia de biocombustível."