10/04/18 11h05

BNDES se une a fintechs para baratear crédito

Valor Econômico

A concentração bancária no Brasil tem sido especialmente problemática para um público: as pequenas e médias empresas. Nos últimos anos, as linhas de crédito disponíveis para essas empresas diminuíram, ao mesmo tempo em que o risco percebido cresceu, assim como os juros cobrados. Com desemprego na casa dos 13 milhões de pessoas, a opção de empreender, para muitos, passou a esbarrar na falta de recursos disponíveis para investir em máquinas, mobiliário ou até para comprar o primeiro estoque.

Sem crédito fácil nos bancos e com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) amarrado por conta de sua dívida com o Tesouro, um novo personagem surgiu para suprir em parte a demanda por recursos de pequenas e médias empresas - as fintechs, empresas tecnológicas com foco em serviços financeiros. Com quase nenhuma regulamentação, essas fintechs passaram a oferecer crédito às empresas, muitas vezes no modelo "peer to peer" (empréstimo entre pessoas), em que ela realiza a análise de crédito de quem quer tomar dinheiro emprestado, dá uma nota e abre em seus sites a possibilidade de pessoas físicas comuns, como eu e você, emprestarem dinheiro para aquela empresa, com uma taxa de juro predefinida, como faz a Nexoos (www.nexoos.com.br).

Em tempos de juro mais baixo, em que as aplicações financeiras já não rendem tanto, o empréstimo via fintechs pode ser uma opção de retorno maior para o investidor pessoa física. Mas o risco nem sempre é percebido adequadamente pelos aplicadores. É esse equilíbrio difícil que o Banco Central (BC) busca hoje. Até o fim do mês a instituição deve anunciar uma nova regulamentação para as fintechs. "Nosso desafio é realizar essa adaptação e, ao mesmo tempo, garantir que os riscos sejam entendidos de forma apropriada e estejam sujeitos aos requerimentos prudenciais adequados", disse na semana passada o diretor de Regulação do BC, Otávio Damaso. O BC precisa zelar pelo bom funcionamento do mercado, mas não pode estrangular o surgimento das empresas que farão a verdadeira concorrência às instituições financeiras, além de garantir inovações que provavelmente não prosperariam em bancos tradicionais, pelo menos não na mesma velocidade.

Um bom exemplo de como essas fintechs podem ajudar na concorrência e na redução dos juros é o do programa do BNDES que prevê a integração de soluções desenvolvidas por fintechs ao Canal MPME, utilizado pelas pequenas e médias empresas para pedir empréstimos em linhas do banco. O BNDES abriu no início do ano consulta pública para apoiar fintechs em quatro segmentos: educação financeira, análise de risco de crédito, "matching" (encontro) entre quem quer tomar crédito e instituições que fornecem financiamentos e em leilão reverso, em que as instituições "disputam" quem dará o crédito, o que em geral leva a taxas menores.

Preocupação do BC inclui percepção correta dos riscos

"Nas pequenas e médias empresas, a assimetria de informações é enorme, e isso se traduz nas condições do crédito. A metodologia e a tecnologia de análise de risco de crédito das fintechs geram uma simetria e isso deve se traduzir em um custo mais adequado para essas empresas. Esse é o objetivo", diz Marcelo Porteiro, superintendente de operações indiretas do BNDES. Em outras palavras: com competição e com conhecimento mais abrangente da capacidade de pagamento, o juro cobrado nos empréstimos deve cair.

Na primeira fase, 26 empresas se inscreveram. Dessas, 20 foram selecionadas para realizar uma prova de conceito (POC), em que têm de mostrar que de fato suas tecnologias funcionam e que podem ser integradas à plataforma BNDES. Muitas delas se apresentaram para mais de uma atividade, como a F(x), que se classificou para apresentar soluções de "matching" e de leilão reverso. A POC deve ser concluída até fim deste mês. No fim de maio, segundo Nelson Tortosa, gerente do departamento de modelagem do banco, os resultados devem ser divulgados. O objetivo é ter algumas soluções já funcionando no segundo semestre de 2018.

No programa do BNDES, as propostas das fintechs estão restritas à integração da plataforma MPME com instituições financeiras. Não há, pelo menos por enquanto, qualquer iniciativa prevista de créditos "peer to peer", diretas, entre tomadores de crédito e investidores pessoa física. Vale a pena acompanhar a iniciativa e ver se, de fato, as taxas de juro cairão. A opção das operações diretas, porém, não deve ser deixada de lado pelo governo, porque representam uma alternativa importante para o financiamento de micro e pequenas empresas. Na regulamentação prevista para o fim do mês, espera-se que essas operações sejam limitadas a R$ 50 mil. Não será pouco, BC?