10/02/14 15h42

FGV é 21ª em ranking global de núcleos de estudo

Valor Econômico

A Fundação Getulio Vargas (FGV) deu início a dois novos núcleos de estudos em janeiro: o Centro Latino-Americano de Administração e Políticas Públicas e o FGV Energia. Eles se somam a outros 67 centros de pesquisa da fundação, responsáveis por posicioná-la como o mais conhecido e mais influente "think tank" brasileiro no ranking mundial "Global Go To Think Tank Index", elaborado anualmente pela Universidade da Pensilvânia, divulgado no fim do mês passado.

"Think tank" é o nome dado internacionalmente a organizações que realizam pesquisas, conferências e fomentam debates na sociedade a fim de influenciá-la.

No ranking atual, no qual foram avaliados cerca de 7 mil think tanks, a FGV aparece em primeiro lugar entre os "think tanks" da América do Sul e Central. Foi também o núcleo de estudo brasileiro mais bem colocado entre todos os "think tanks" do mundo: ocupa a 21ª posição quando a listagem inclui os Estados Unidos, e o 19 º lugar quando exclui os Estados Unidos, principal país em quantidade de "think tanks" no mundo, com quase 2 mil instituições desse tipo.

O "Global Go To Think Tank Index", elaborado desde 2006, é feito a partir da opinião de jornalistas, autoridades de política econômica e dos próprios "think tanks", que respondem a uma pesquisa onde nomeiam e classificam os centros de pesquisa que se destacaram naquele ano.

O índice é criado a partir de um processo aberto de nomeação, que depois passa por um painel de experts para revisão. Entre os critérios para escolher os melhores, há uma medição quantitativa (livros, conferências, aparição na mídia, entre outros), além de uma "medição de impacto". Impacto significa, segundo a universidade americana, a real influência que a produção do "think tank" acaba tendo na sociedade. Nesse critério, enquadram-se quais recomendações de determinado "think tank" foram adotadas ou consideradas por autoridades políticas ou por membros da sociedade civil organizada; qual papel ele teve como aconselhador de partidos políticos ou sobre candidatos; a quantidade e qualidade das aparições na mídia; se apareceu em mídia que influencia aqueles que tomam as decisões; se houve citações sobre o "think tank" em jornais acadêmicos, entre outros aspectos.

"Esse ranking projeta a imagem da FGV sobre gestores públicos. Ela acaba tendo uma voz ativa mais forte na sociedade", acredita Marlos Lima, professor da FGV. O ranking chegou a citar um dos estudos da FGV como um dos mais influentes produzidos por um "think tank" em 2013 numa escala global: "A Nova Classe Média: O Lado Brilhante dos Pobres", coordenado por Marcelo Neri, professor da FGV e atual presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). "A FGV praticamente cunhou este termo [a nova classe média]", reforça Lima.

Na lista ainda referente apenas aos núcleos da América Central e do Sul, outros seis brasileiros apareceram: Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), em 8º lugar; Instituto Fernando Henrique Cardoso (11º); Ipea (12º); Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) em 14º lugar; Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (24º); Instituto Millenium (32º).

A FGV, o Cebri e o iFHC, na classificação regional, ficaram à frente de um dos principais centros de pesquisa públicos do país, o Ipea, o que chamou a atenção de alguns pesquisadores. Mas, no entanto, eles destacaram que quando avaliado entre os "think tanks "ligados a governos em todo o mundo, o Ipea ficou em 24º lugar. Juntamente com a Fundação Alexandre Gusmão (37º), foram os dois únicos representantes latinos na lista de 40 centros de estudo desse tipo no mundo. O Ipea foi procurado, mas não concedeu entrevista.

Para Sérgio Fausto, superintendente do Instituto Fernando Henrique Cardoso (iFHC), podem ser discutíveis os critérios do ranking, porque há várias maneiras de se medir a relevância de um "think tank", mas ele entende essa pesquisa como uma avaliação do tipo 'top of mind' (o que está na cabeça das pessoas), "então aparecer nesse ranking é relevante", diz.

"Todo mundo desse meio [de "think tanks"] comenta com alguma ressalva esse tipo de ranking, mas o valoriza ao mesmo tempo, porque é um indicador", completou, citando que há, muitas vezes, comparações "entre peras e maçãs", já que há grandes diferenças de estrutura de orçamento entre os centros de pesquisa e a proximidade maior ou menor com a máquina pública não é necessariamente considerada por quem vota na pesquisa, especialmente na eleição de "think tanks" voltado a políticas públicas.

O iFHC se destacou na lista da América Central e do Sul e apareceu no 68 º lugar de 70 no ranking de núcleos em todo o mundo com maior impacto justamente em políticas públicas. O iFHC, acredita Fausto, destacou-se por trabalhos como as conferências realizadas sobre democracia na América Latina em 2013 e em razão da agenda do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que assumiu temas de influência sobre políticas públicas e tem sido chamado para discutir sobre eles em diferentes países. Entre esses assuntos estão, por exemplo, a polêmica descriminalização da maconha.

Para Luiz Augusto Castro Neves, presidente do conselho curador do Cebri, chega a ser curioso o Cebri chamar a atenção internacional enquanto no Brasil o seu principal tema de discussão, as relações internacionais, parece fora das prioridades. "Basta ver que as relações internacionais não fazem parte da nossa agenda de política-social. Os candidatos [nas eleições] mal abordam isso e este também não é um tema que fica em moda no Congresso Nacional."

O Cebri apresentou no ano passado uma pesquisa sobre os desafios na defesa nacional brasileira diante da maior inserção internacional do país. O tema da segurança nacional foi um dos que o projetaram no ranking. Neste ano, o Cebri programa criar um núcleo específico de estudos de defesa, que será dirigido por Eduardo Brick, professor da Universidade Federal Fluminense (UFF).

"O Brasil está tendo cada vez mais interesses fora de suas fronteiras, investe em países vizinhos, e uma boa parte da riqueza está no pré-sal, que está em área off shore", diz Castro Neves. "Em que medida essa riqueza que está um pouco fora da porção continental do país está sendo efetivamente controlada e monitorada pelo Brasil?", questiona.

Castro Neves ressalta ainda que o destaque no ranking demonstra que, pouco a pouco, "o Cebri está conseguindo, digamos assim, vender o seu peixe, porque o Brasil de hoje, quer queira ou não, apesar das resistências culturais, tem que se internacionalizar".

Como um dos think tanks mais antigos do país, o Cebrap (criado em 1969) saiu-se bem na listagem de centros com "excelentes programas de políticas públicas". Embora há anos seja conhecido por estudos em políticas públicas de forma geral, ele tem adicionado novos temas a essa agenda, como a educação, que vem sendo analisada mais de perto nos últimos dois anos. No ano passado, o Cebrap divulgou um estudo de avaliação da educação secundária.

Entre as características que diferenciam o Cebrap e o colocaram no ranking, a diretora científica Angela Alonso aponta que "as pesquisas não são feitas como acontece muitas vezes em universidades; um processo solitário ou de apenas um pesquisador ou de uma única equipe de especialistas".

Segundo Angela, o fato de o Cebrap ser interdisciplinar faz com que especialistas de diferentes áreas discutam uma mesma pesquisa, havendo ganhos significativos para o resultado. "Temos, por exemplo, um cientista político palpitando sobre o trabalho de um antropólogo. São interações que não são tão frequentes por aí".

Na outra ponta, entre os mais recentes "think tanks" criados no país, o Brics Policy Center (BPC), afiliado à PUC-Rio, criado no fim de 2010, tem se dedicado a estudos de relações internacionais dos países emergentes. Ele se destacou na lista sobre "a melhor nova ideia ou paradigma desenvolvido por um think tank" e também na categoria que a universidade americana chamou de "think tank para ficar de olho" (em inglês, think tank to watch).

Paulo Esteves, supervisor geral do BPC, acredita que o destaque tem a ver com a criação de um espaço de discussão e de pesquisas sobre os hemisférios Norte e Sul com "isonomia" de tratamento. "O BPC conseguiu desenvolver algumas práticas - não necessariamente ideias que são interessantes -, principalmente a capacidade de criar espaço de debates entre atores sociais distintos e um ambiente em que o Norte desenvolvido dialoga em condições de isonomia [com o Sul, dos países em desenvolvimento]", destacou. "Tentamos criar espaço para diálogo Norte-Sul baseado em evidências não ideológicas. O Sul é apresentado não como um espaço dos que aprendem, mas daqueles que também têm a ensinar", afirma Esteves.

Na América Latina, o Brasil é o segundo país com mais "think tanks", 81. Perde apenas para Argentina, com 137.